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Uma jornada sem fim II - Pântano

Christine

Três dias após ter atravessado o rio, tive que levantar acampamento antes da hora, pois no meio da tarde uma chuva suave começou a cair. O dia abafado havia exigido muito de minhas forças e de minha determinação, mas as gotas geladas trouxeram conforto para meu corpo, e reflexões para minha mente.

De dentro da tenda eu observei a água caindo pelos galhos, gotejando das folhas com sua percussão monótona, e poças começaram a se formar no chão coberto de folhas e raízes. O vento frio viajava por entre as árvores, e chegava ao meu rosto como uma carícia que acalmava a alma. Vez ou outra um trovão soava pelos céus, ecoando nas montanhas, como pedras enormes rolando sobre as nuvens.

As poças trouxeram lembranças indesejadas, de tempos em que fui assombrado pelo medo de ficar atolado em algum pântano qualquer. Pois havia um atoleiro onde eu vivia, por causa da maré que fazia as águas do oceano invadirem a terra por muitos quilômetros, e vi muitas pessoas boas ficarem presas lá, ou mesmo desaparecerem nas águas escuras e lamacentas. Com o tempo o pântano aumentou, e a terra parecia derreter sob os pés. Ficar preso lá seria como uma sentença de morte para mim, que sempre desejei ser livre.

Encarando as poças eu me vi preso ao chão, com lama pelos joelhos, e afundava cada vez mais, como se a terra quisesse me engolir. Me imaginei desesperado, sentindo que quanto mais me debatia e lutava, mais o lamaçal me sugava. Logo eu já estava com lama até a cintura, e minhas pernas estavam presas. A maré logo subiria e eu morreria, fosse afogado nas águas salgadas, fosse asfixiado pela lama. Em pouco tempo todo o meu corpo havia afundado, e eu não via esperança. Gritei, mas ninguém me ouviu.

Meu devaneio se dissolveu ao som de um trovão. No interior da barraca, deitado, eu sorri, feliz pelo momento em que avancei sobre o rio e iniciei minha jornada. Poder caminhar rumo ao desconhecido, com todas as suas possibilidades, era o que fazia com eu me sentisse livre, e pântano nenhum tiraria isso de mim.
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23/10/2013.

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