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Árvores secas

Krappweis
Cristofer entrou na cafeteria e foi direto à mesa do canto, onde havia uma mancha de umidade no papel de parede. Provavelmente ele era a única pessoa que se sentava naquele canto. Pensou em puxar um livro  para ler enquanto tomava um capuccino e comia um pedaço de torta, mas viu que a atendente que saiu do balcão para atendê-lo era aquela moça de sempre. "Amanda o nome dela? Acho que é Amanda."

- Oi! - disse Amanda, sorrindo.
- Oi! - respondeu Cristofer se esforçando para sorrir também. Por fim conseguiu fingir uma expressão de contentamento, aquela que se espera que surja no rosto quando temos que conversar casualmente com alguém.
- Você sumiu, pensei até que tinha se mudado.
- É, faz tempo que não venho aqui. - "Sumi de tudo, sumi das pessoas, e queria que o mundo sumisse também."
- Que bom que veio! - disse Amanda, empolgada, mas corou em seguida. -Quero dizer... que bom que voltou. Bom. Era capuccino e um pedaço de torta de limão, certo?
- Isso mesmo! Você ainda lembra!
- Lembro. Você comia isso todos os dias! Eu já trago.

A cafeteria envelhecera. As mesas estavam mais surradas, havia mais riscos no chão, a máquina de capuccino parecia fazer mais barulho que antes. O cheiro ainda era o mesmo, assim como Amanda, que aparentemente era a única funcionária que ainda trabalhava lá. Cristofer também envelhecera, por dentro, em seu comportamento. Já não era o mesmo, e se sentia como a máquina de cappuccino, já tivera tempos melhores, e hoje em dia só faz muito barulho, e às vezes nem conseguia fazer tudo aquilo que fazia antes. Se sentia puído feito um casaco velho largado em algum brexó.

O capuccino e a torta chegaram, acompanhados do sorriso saudoso da atendente, que logo se foi, atender outros clientes. "Deve ter percebido que eu sequei." Ele esperava que sim, afinal queria que o mundo sumisse, e isso incluía a pobre Amanda, que se esforçava para ser agradável. Ela parecia ser uma flor solitária, tentando respirar em um jardim dominado por ervas daninhas.

"Ninguém olha para árvores secas. Elas perdem suas folhas, perdem seu verde, sua casca fica cinzenta, desbotada, e logo elas se tornam invisíveis, exceto para aquele que têm a sensibilidade de perceber sua presença, e o olhar cuidadoso lamenta aquela sombra de existência. Somente o vento é caridoso, toca as lágrimas que escorrem pelo tronco velho."

E observando a feliz Amanda servindo os clientes, Cristofer percebeu que ela era a única coisa que não envelhecera naquela cafeteria. Ela não se entregara. Talvez fosse sua simplicidade, sua superficialidade. E Cristofer queria ser profundo, e de tão profundo atingiu o fundo do poço. Ficou cinza, congelado no tempo, ficou barulhento e velho, como a máquina de capuccino. Virou árvore seca. Era melhor apenas existir.

Pagou a conta e lançou um sorriso doloroso para Amanda, que respondeu com seu sorriso habituau. E aí ele percebeu as rugas sutis em volta de seus olhos, que não eram tão felizes quanto o resto do sorriso. Num segundo frio e arrebatador ele percebeu que ela estava perdendo suas folhas. Decidiu nunca mais voltar àquela cafeteria.
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Marlon Weasdor, 18/02/2013


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